1.

2.


                                                                Daniel Barroca
“Dripping Hand”
1.     Primeira aproximação: o nome aponta para uma acção-objecto – acção instalada e acção sofrida. Mas, “dripping hand” é um fragmento, e um fragmento subtraído e diferido, naquilo que é “enunciado” nesta imagem-vídeo de Daniel Barroca: registo (subjectivo) de um acontecimento (alegórico) (instalado).
2.     Movimento de concentração: a acção sofrida. Dripping hand descobre a co-materialidade entre um drama de destruição e as forças físicas a operarem nesta construção: erosão, gravidade, resistência e atrito. A substância dramática da peça não é recolhida no movimento cíclico da vida, ou na morte, seja a morte natural ou dada, mas numa acção, ou dramaturgia, física. No movimento físico da destruição consome-se a “alegoria” (e os seus múltiplos sentidos). Física elementar niilista.
3.     Movimento (in)diferido: a (im)possível reprodução.   As formas do “registo” remetem normalmente para a construção do lugar “neutral” do espectador face a um objecto, desejavelmente na retórica do apagamento do espectador. A “documentação” do acontecimento dripping hand é atravessada pela presença de um olhar incorporado: câmara subjectiva ou construção do corpo-câmara em que o olhar segue o acontecimento – o movimento de destruição - e é vibrado pelos movimentos da presença do corpo: movimentos instáveis, movimentos de regulação da proximidade e vertigem. Estatuto paradoxal deste “espectador”: “reprodução” visual do acontecimento sofrendo as acções e reacções do corpo próprio.
4.     Estação 1: nós: segundos “espectadores” de Dripping Hand. Nós somos o último elo nesta cadeia – montado pelo autor – de subtracção e diferimento. O que chega até nós? Se a pergunta pode ter lugar é porque Dripping Hand não se consume na positividade da sua ambígua construção vídeo. Possuímos a experiência que a obra constrói – e não nos é dada outra – que é também a experiência de uma ausência. Chegam-nos apenas fragmentos, escombros, restos e sobretudo a consciência sensível dos filtros… Na teoria estética muito tem sido escrito sobre a posição – de vários modos - privilegiada de liberdade e juízo do contemplador. A obra do Daniel Barroca faz-nos permanentemente suspeitar desse lugar “exterior” ao qual a “presença” sempre se subtrai e difere.
5.     Estação 2: nós: ironias da contingência. O som directo capta simultaneamente China Girl – com função de fundo ambiente de trabalho, som “deslocado” de uma função no trabalho – e os movimentos ruidosos das acções desencadeadas no trabalho – função de registo. Assim, na construção vídeo, ao espectador chega uma única imagem sonora – em “registo duplo” - mas que opera um permanente des/fasamento com a “imagem”.
6.     Vertigem: estamos no meio. Dripping Hand constrói-se sobretudo na “mise en abyme” de espaços, de meios de trabalho, e de corpos, das acções do e sobre os corpos. Envolvendo a imagem – e usamos a palavra “imagem” apenas para simbolizar a rede de relações construídas - há um afecto de desolação, de assolação trágica. Talvez a visão que alimente o trabalho de Daniel Barroca seja a de que o mundo é – ou é esse o seu estado - um limbo e o artista o (des)fazedor de velaturas.  Paradoxo do artista, ou talvez, a sua pequena falta de congruência: seria preciso construir para expor essa condição destrutiva.

            Fernando Poeiras
Legenda das imagens
1. Chegada de Gugunhana ao porto de Lisboa em 13 de Março de 1896 documentada por Chaves Cruz.
Imagem intervencionada por Daniel Barroca a partir de cópia digital cedida pelo Arquivo Fotográfico de Lisboa.
2. Chegada de Gugunhana ao porto de Lisboa em 13 de Março 1896 documentada por Chaves Cruz.
Imagem intervencionada por Daniel Barroca a partir de cópia digital cedida pelo Arquivo Fotográfico de Lisboa.
3. Prisioneiro sujeito a tortura prolongada em S-21, Cambodja, 1975-79.
4. Guerrilheiro do PAIGC capturado por soldados portugueses, 1972-74.


--
Agradecimentos:
Annaïk Lou-Pitteloud
Carina Hellerup
Dinora Lucas
Esteban Piedra Leon
Gonçalo Barreiros

Agradecimentos Especiais:
Fernando Poeiras
Rijksakademie van Beeldende Kunsten
André Sousa
Mauro Cerqueira
______________


Daniel Barroca 
Dripping Hand

Inaugura | Opening: 12.11.2010 | 22h
12.11.2010 <<< 05.12.2010
Uma Certa Falta de Coerência
Rua dos Caldeireiros 77, Porto


Aberto aos Sábados das 15h30h às 19h30. 
Open Saturdays from 15.30pm to 7.30pm.
Visitas por marcação através dos tel. 917910031 / 919272115. 
To visit by appointment call 917910031 / 9192712115

acertainlackofcoherence@gmail.com